Décimo segundo domingo de confinamento e… ops. Bem, a sensação é meio assim, mesmo. E ela traz à tona sensações e temas sobre os quais sempre pensei, porém nunca tive tempo ou oportunidade (devido ao fato de a crônica não ser exatamente meu estilo predominante de escrita) de escrever a respeito.
Lembro que eu, criança, gostava de ler os livros da coleção “Perry Rhodan”, dos autores alemães K. H. Scheer e Clark Darlton. E também achava impressionante a tecnologia da série cômica “Agente 86”, estrelada pelos hilários Don Adams (86) e Barbara Feldon (99) – aliás, 99 foi uma de minhas primeiras paixões platônicas infantis, pelo que me recorde. Os modos de comunicação, tanto nas narrativas quanto na série, eram o que mais me impressionavam, eu lembro. E hoje, vejam só, tudo aquilo é bem real.
As redes sociais se tornaram um elo entre pessoas do mundo inteiro e fonte de conhecimento e informação. Por exemplo, muitos estão me lendo agora graças a isso. E neste dia percebi o quanto eu entendo melhor meus alunos. Como é difícil sair da frente de um computador ou de um celular quando se está aborrecido com a vida! E olhem que eu faço um bom revezamento entre música, leitura, filmes… fora e dentro das redes. Mas essa quarentena também mostrou o quanto as pessoas precisam de VER umas às outras, ao menos. Chamadas de vídeo, antes incomuns, agora são quase uma necessidade. Aplicativos de conversas em grupo viraram febre.
Enquanto isso, os afazeres domésticos, as atividades físicas e mesmo o home office vão ficando pra depois. É estranho para mim, que tenho fama de ser responsável ao extremo. Entretanto, é como se eu estivesse vivendo um lapso temporal que me perdoe e diga: “quando tudo voltar ao normal, você estará incluído no tudo”. A necessidade premente agora é falar com as pessoas, de alguma forma. A tal modernidade líquida de Zygmunt Bauman, o filósofo polonês que preconizou o melhor estudo sobre as relações modernas, é um fato que vai ser visto de outra forma, depois do Coronavírus. Porque agora elas estão mais sólidas, embora paradoxalmente mais distantes. Entramos num processo de solidificação impulsionado pela frieza de uma doença galopante. Depois disso, o corre-corre do dia a dia deverá reaquecer o distanciamento, infelizmente, natural.
Eu só continuo firme nas escolhas de redes sociais. Meu estilo prolixo de escrita abomina limitações como a do twitter. Eu fiz um, no começo, e meu e-mail ainda recebe as notificações, mas sequer lembro da senha (e nem faço questão); o instagram é muito imagem, ninguém para com a finalidade de ler. Uso-o mais para a divulgação de meu trabalho literário. E o Facebook continua sendo meu favorito, como um dia foi o Orkut. Só lamento a debandada de pessoas de lá. Pior, há gente que nem se dá ao trabalho de desativar sua conta. Aí quando vou dar os parabéns pelo aniversário é que percebo que a pessoa não posta, comenta ou curte nada, de ninguém, há meses. Faço eu, então, o “cancelamento da amizade”. Tem sido minha maior atividade nesses dias, risos, deletar os cadáveres facebookianos, temendo que, em breve, não reste mais ninguém e que as próximas redes sociais não privilegiem as palavras, já que quase todo mundo está tão avesso à leitura. E autores de frases como: “verei quando virar filme”, “aff!, textão”, “pra quê esse livro?” ou “escreva menos, dá preguiça de ler” viraram meus inimigos virtuais mortais. Daria a todos eles o mesmo final de Fortunato em “O barril de Amontillado”, de Edgar Allan Poe, sem qualquer piedade. Essas ofensas estúpidas seriam guizos distantes, para mim… minha doce vingança.
Ainda bem que resistem alguns fiéis leitores de meus textos, aos quais já deixo meu muito obrigado por serem insistentes. Muitos nem conheço, no melhor estilo do filme “84 Charing Cross Road” (Nunca te vi, sempre te amei), com os impagáveis Anthony Hopkins e Anne Bancroft. Quem sabe um dia, depois do Covid-19, depois do Facebook, não conheço todos vocês? Será um prazer.
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