Arrigo Sacchi, técnico italiano vice-campeão da Copa do Mundo de 94 (perdendo para o Brasil, por sinal), uma vez disse: “O futebol é a coisa mais importante dentre as menos importantes”. Essa máxima, repetida várias vezes pelo apresentador de programas esportivos Milton Neves (a tal ponto que muitos pensam ser dele), passa a ter sua representatividade aumentada em tempos como estes. Para muitos, futebol é meramente político, embora também seja Arte.
 
Provas disso são Sérgio Rodrigues (mais conhecido por sua alcunha Stanislaw Ponte Preta), Nelson Rodrigues, Ruy Castro, Luís Fernando Veríssimo, alguns no Brasil que enveredaram na crônica – ficcional ou não – sobre nosso esporte favorito. Recomento, para quem tem interesse no campo, o delicioso filme “Boleiros – Era uma vez o futebol…”, do diretor Ugo Giorgetti e elenco de um quilate de Lima Duarte, Rogério Cardoso, Flávio Migliaccio, Otávio Augusto, Cássio Gabus Mendes, André Abujamra e Marisa Orth. Risadas garantidas, mesmo que você pouco entenda do jogo de onze pra cada lado correndo atrás de uma bola.
 
Hoje, domingo, deveria ser o final da primeira rodada do Campeonato Brasileiro de 2020. Sequer os estaduais foram encerrados, ainda, e na maioria dos estados, nem mesmo em sua primeira fase. E há uma pressão muito grande para o retorno do futebol (ainda que de portões fechados). Não se trata apenas de uma questão financeira, para os clubes, muito menos de fornecer distração aos aficionados pelo esporte bretão, em tempos de isolamento social.
 
Trata-se de uma questão política. Se os clubes de futebol entenderem que devem colocar atletas para treinar e jogar, mantendo o natural contato físico que a modalidade exige, será a chave de que o Governo Federal precisa para avalizar seu desejo de as pessoas circularem com normalidade, pelas ruas ou em suas profissões, pois “se um jogador pode, eu também posso”. Trata-se de um perigoso e maquiavélico plano arquitetado para desqualificar o isolamento necessário, através da exposição abusiva dos clubes (e seus atletas, comissão técnica, funcionários, e famílias de todos esses) a um vírus implacável.
 
À parte os milhões que o futebol profissional movimenta para confederações, federações e clubes, existe o interesse de dezenas de emissoras de televisão, sobretudo os canais de fechado de pay-per-view, que desejam o retorno das atividades… e vendas. Felizmente, num tempo em que AINDA temos liberdade de expressão, vários comentaristas das próprias emissoras fechadas são contra o retorno precoce, em programas de debate. Os clubes brasileiros que apoiam a iniciativa, cinicamente, apontam para um provável retorno aos treinos e ao futebol ainda neste mês em países como Alemanha, Itália e Espanha. Nações estas que, evidentemente, estão em outro ponto das curvas de crise pandêmica e que possuem um sistema de saúde muito mais organizado e dsiponível que o nosso.
 
Sempre foi assim, com o esporte mais popular do país: usado como arma ufanista no tricampeonato mundial de 1970, em plena ditadura, e como palanque na Copa de 2014 e nas Olimpíadas de 2016. Embora não seja uma triste exclusividade nossa (vide o que a Argentina fez para ser campeã em 1978, para valorizar o regime militar massacrante de Jorge Videla), o Brasil parece ter uma predileção por atrelar o sucesso esportivo com resultados governamentais. Quem não lembra das imagens de supostos atletas propagandeadas por Fernando Collor e pelo atual presidente? Tudo balela. Tudo em nome da associação entre sucesso e esportes.
 
 
Ou seja, vamos, voltamos e tudo não passa de dois pontos: política e dinheiro. Pouco importa se mandar jogadores a campo, mesmo sem torcida (isso SE você for tolo o suficiente para não acreditar que torcedores se aglomerarão em torno do estádio, a fim de que seu grito de apoio seja ouvido lá de dentro, e para beberem de forma burlada nos arredores) vá trazer riscos irresponsáveis para todos os envolvidos e suas famílias. Os líderes atuais do país não ligam para isso. O importante, para eles, é dar uma mensagem mentirosa de que “já dá pra sair e voltar ao trabalho”.

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