Hoje minha diacrônica deveria ser sobre meu primeiro dia como professor de aulas online, minha versão de “Eu, Robô”, do Asimov, salvo a exagerada comparação. Porém, vou deixar para amanhã este relato. Nesta vou me deter em um ponto específico que há muito incomoda, com ou sem pandemia. Talvez até já tenha me referido a ele em outra diacrônica, não recordo (nem releio). Todavia, se eu já o tiver feito, paciência. Coloque tal redundância temática na conta de uma irritação profunda com o assunto. Pode ser encarado como uma intratextualidade rabugenta.
 
Antes de mais nada, quero deixar claro que não pretendo desmerecer aqui quem vai em minhas páginas “curtir” ou comentar qualquer coisa que seja. Quem posta, quer retorno, óbvio, fica feliz. Ninguém faz de seu Facebook ou qualquer outra rede social um mero diário, como se não importasse nada a opinião alheia. Se fosse assim, cada um escreveria seu próprio “Diário de Anne Frank” e estaria pouco ligando se ele fosse encontrado. É evidente que queremos um “feedback”.
 
Contudo, é dolorido observar as reações muito diferenciadas, dependendo do tipo de publicação. Exemplo explícito: até este exato momento, 17h30 (eu avisei… que nem sempre poderia mais escrever pela manhã…), minha diacrônica de ontem teve 22 curtições e 6 comentários. A notícia da morte de Ciro Pessoa, um obscuro, porém excelente homem do rock, 48 curtições e 14 comentários. E os registros fotográficos de meu primeiro dia como “videoteacher”, 220 curtições e 55 comentários!
 
Deixa-me frustrado imaginar que as pessoas prefiram registros visuais e notícias breves (as quais nem sei se as pessoas abrem, para ler… muito provavelmente, não) a textos mais elaborados e complexos. A tal modernidade líquida, do já citado em outra crônica, Bauman, se mostra cada vez mais preocupante para quem lida com a palavra. Há uma tendência vertiginosamente crescente de “otimizar” mensagens e reduzir tamanhos de textos em escalas assustadoras. Quanto mais se fala usando menos caracteres (isso, caracteres, não palavras!), “melhor”.
 
Ninguém se importa mais se o português está correto, se há estilo, se há criatividade na mensagem. As pessoas, inadvertidamente guiadas por conceitos questionáveis de “Preconceito linguístico”, como fala o título da obra de Marcos Bagno, passam a CRITICAR quem pratica o português correto, ou gosta de fazer bom uso dele. Vai haver quem diga que não é esse o propósito do autor e dos defensores dessa ideologia linguística, mas não vai me convencer. Para mim, a partir do momento em que há uma permissividade do nível de: “o importante é ser entendido e haver comunicação”, isso, é, SIM, uma conclamação ao preconceito contra quem trabalha no esmero das palavras.
 
Isso se manifesta nas brincadeiras sobre “textão”, “quando virar filme eu vejo” etc etc. Ao declarar que detesto redes sociais como o Twitter, porque há limitação de caracteres, ou que só uso o Instagram para pequenas divulgações do meu trabalho artístico, pois lá as pessoas mais veem fotos que comentam, vocês não têm ideia de quantas pessoas olham para mim com uma cara estupefata, ou esperando um desmentido, dando um sorriso inquiridor, como se eu estivesse falando uma piada que ainda não foi concluída…
 
Para esclarecimento, gostaria de que entendessem que não defendo que todo brasileiro tenha obrigação de falar e escrever corretamente. Acho que há momento adequado para tudo: escrita formal, informal, literária. O que reclamo é da criação de um crescente deboche a quem prefere redigir corretamente na maioria das vezes, gerando um desprezo por textos de alta qualidade, no cidadão comum. Da linguagem oral, então, nem falo. Essa precisa de menos primor, ainda, só da circunstância adequada. Não tenho preconceito linguístico. Quero é valorização da nossa língua e, principalmente, de nossas mensagens. É um viés bem diferente.
 
 
Não tenho exatamente a quem culpar, se à falta de cultura do brasileiro, se à modernidade líquida, se aos seguidores da ideia de preconceito linguístico, se a uma geração automatizada e sem concentração para escrever, muito menos para ler. Só sei que não gosto de me sentir uma ilha de letras e palavras cercada de “selfies” por todos os lados.

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